sábado, 14 de janeiro de 2017

O que não pode ser visto

Hoje tivemos mais um capítulo do ~Cidade Linda~, programa criado pelo novo prefeito da cidade de São Paulo, que já no nome carrega um julgamento de gosto, o que, convenhamos, não cabe muito bem a uma Prefeitura. Mais uma vez a narrativa que se reforça e se constrói é por meio de um vocabulário agressivo, que prega guerra, vigilância, delação. E contra o que se quer guerrear? O que se quer apagar? O que não é para ser visto? O que é para se censurar? Se esse conjunto de palavras já não fosse por si só perigoso e problemático, o que não se diz, as palavras que estão escondidas nas frestas desta maquiagem nos apontam o caminho que esta nova gestão parece querer trilhar. Se a ordem do dia é calar e apagar quem povoa as superfícies da cidade com diversidade, a ordem do dia também indica repressão e um aumento da criminalização, questões que já estão ficando evidentes no nosso dia-a-dia na rua. O que se quer apagar tem cor, classe social e endereço. Uma cultura de rua que vem das margens, mas que não se limita a elas, circula por toda a cidade, transpondo barreiras físicas e simbólicas. Guerrear é não querer o diálogo, diálogo que nem sequer tentou-se estabelecer. Pintar uma cidade inteira de uma só cor, é tirar da visibilidade das superfícies a diversidade que faz da nossa cidade o que somos. Aqui não é Miami, aqui é São Paulo mesmo, e é essa cidade que queremos para a gente. Uma cidade que, com todas dificuldades, permite diferentes formas de experiências, vivências e circulação. Essa cidade nunca deixaremos ser maquiada. Talvez o que se enxergue no spray, nos rolinhos e nas tintas seja mesmo uma arma, mas trata-se da arma das ideias, e as nossas sempre serão livres.